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Brasil - Siderúrgicas acusadas de crime ambiental demitem 700 trabalhadores.

Publicada em 2011-08-19



Cerca de 700 pessoas serão demitidas com a paralisação de três siderúrgicas instaladas em Sete Lagoas, Região Central de Minas, acusadas de irregularidades na área ambiental. As demissões engrossam o contigente de desempregados em um dos principais polos do país de ferro-gusa (matéria-prima para produção de aço), que ainda não conseguiu se recuperar da turbulência econômica mundial de 2008.

Três siderúrgicas de Sete Lagoas estão reduzindo operações e demitindo trabalhadores como José Afonso Gonçalves (Marcos Avellar/EM/D.A Press)  
Três siderúrgicas de Sete Lagoas estão reduzindo operações e demitindo trabalhadores como José Afonso Gonçalves

A crise chegou à casa do metalúrgico José Afonso Gonçalves, que trabalhava na Sidermim há dois anos, mas que fez acerto com a empresa na manhã da última quarta-feira. Casado e com dois filhos, passa a contar agora apenas com o seguro-desemprego e a renda da esposa, que trabalha como cozinheira. “Vou ter que equilibrar minhas contas e cortar algumas regalias que a gente tinha, como ir à pizzaria e usar cartão de crédito”, disse.

Antes, além do salário de R$ 1,1 mil, ele ainda tinha os benefícios pagos pela siderúrgica, como cesta básica, planos de saúde e odontológico. Segundo José Afonso, a produção estava a todo vapor e, por isso, o anúncio foi um choque para todos. A expectativa, não só de José Afonso, mas de todos os de 250 trabalhadores demitidos, é que a produção retorne em breve. “Mas quando? Ninguém sabe”, lamenta.

De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas Mecânicas e de Material Elétrico em Sete Lagoas, Ernane Geraldo Dias, a Itasider anunciou demissão de mais 150 pessoas e a Usisete outras 280. “As homologações já começaram”, disse. Segundo ele, das 21 empresas do setor na cidade, 10 estão fechadas. Juntas, já empregaram 5 mil trabalhadores, mas hoje somam cerca de 1,8 mil postos de trabalho.

A Sidermin confirmou as demissões e a interrupção das atividades. “A empresa não tem como saber se o carvão é de origem legal ou ilegal. Ela faz a consulta no sistema do próprio Ibama. Assim, a responsabilidade da fiscalização é do Ibama, e não do consumidor final”, afirmou o advogado Leonardo Isaac Yarochewsky. Os responsáveis pela Itasider e Usisete não concederam entrevista.

O coordenador-geral da promotoria por bacia hidrográfica do Ministério Público Estadual, Paulo Cesar Lima, disse que não existe, até o momento, nenhum embargo de atividades. “Estamos em fase de avaliação do documentos para tomar as medidas cabíveis, ou seja, ação civil pública e, eventualmente, ações criminais. Não queremos, claro, inviabilizar as atividades. Queremos a construção da sustentabilidade”, disse.

CONJUNTURA As paralisações pelas acusações de irregularidades ambientais se somam à intensificação da crise econômica norte-americana e na zona do euro e interrompem o início da recuperação da exportação do ferro fundido produzido no município, segundo pesquisa do Núcleo de Estudos Econômicos e Sociais (NEES), ligado ao Centro Universitário de Sete Lagoas (Unifemm).

De janeiro a junho de 2011, a participação do produto na pauta de exportação do município chegou a 46,63%, enquanto no mesmo período do ano passado era de 42,64%. Em igual base de comparação, o valor das vendas externas registraram crescimento de 75,35%, atingindo US$ 298,9 milhões. “Minas já chegou a exportar 24% da produção total de gusa e hoje a participação é de 11%. Perder mercado é ruim e reconquistá-lo é muito difícil”, pondera Afonso Gonzaga, presidente do Sindicato da Indústria de Fundição de Minas Gerais.

Palavra de especialista
Regularização é a meta

. Jair Jaloreto Junior
. Advogado especialista em direito penal empresarial
“Independente da Operação Corcel Negro, muitas vezes o Poder Judiciário acaba se esquecendo de sua função social e coloca o meio ambiente em patamar superior ao da sociedade. A lei de crimes ambientais prevê a possibilidade de medidas brandas, quer permite a continuação da atividade econômica, mas, dessa vez, sem irregularidades. Não estou defendendo a ilegalidade, claro. A culpa não é do poder fiscalizador, mas sim daquele que descumpriu a lei. Mas o empresário acusado também precisa ajudar a reparar o dano causado à sociedade, pagando os impostos devidos e cumprindo o plano de recuperação ambiental, por exemplo. A lei ambiental permite flexibilização de forma envolver a justiça social e impedir que, no caso, quase 700 pessoas percam o seu trabalho. Minha avaliação, contudo, vale para qualquer situação.”

Entenda o caso

A operação batizada de Corcel Negro desvendou, no fim de julho, uma organização formada por siderúrgicas, agenciadores, transportadores e produtores de carvão ilegal de Minas e da Bahia, acusadas de transformar o cerrado e a caatinga em carvão, insumo usado na produção de ferro-gusa.

A ação resultou na prisão de 40 pessoas, embargo de quatro siderúrgicas e apreensão de 1 mil toneladas de ferro-gusa, 78 caminhões, 5 mil metros cúbicos de carvão e 22 armas.

A operação foi realizada por uma força-tarefa formada pelos Ministérios Públicos estaduais de Minas Gerais (MP-MG) e da Bahia (MP-BA), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), Polícias Civil e Militar e secretarias de Segurança Pública (SSP) e de Meio Ambiente (Sema).

As investigações foram iniciadas em agosto de 2008, quando veículos de carga que transportavam carvão ilegal rumo a Minas Gerais foram apreendidos pela Polícia Rodoviária Federal da Bahia. Fiscalizações realizadas pelo Ibama identificaram desmatamentos e produção ilegal de carvão vegetal e que fraudes estariam sendo cometidas no sistema de Documento de Origem Florestal (DOF).

Paola Carvalho e Marcos Avellar - Estado de Mina


Fonte: Estado de Minas