Notícias
É inconcebível o aço brasileiro custar 40% mais que o chinês.
Tweet
As vendas despencaram 20,1%, enquanto o grupo fazia investimentos na fábrica em Porto Real, no Rio de Janeiro. No começo de agosto, foi lançado o novo C3, que é a grande aposta da montadora francesa para tentar virar esse quadro. Na linha de frente dos negócios da empresa na América Latina está o português Carlos Gomes, que tem como meta ampliar a participação de mercado na região dos atuais 5,4% para 7%, até 2015. Embora otimista com o futuro da economia brasileira, o executivo não poupa críticas ao chamado custo Brasil. “O preço da energia interdita a operação industrial”, disse Gomes em entrevista exclusiva à DINHEIRO. “É inconcebível o aço brasileiro custar 40% mais que o chinês.”
Dinheiro – Qual é o cronograma de investimentos da PSA no Brasil?
Carlos Gomes – Entre 2012 e 2015, vamos investir R$ 575 milhões por ano. Além disso, o novo C3, fruto de um trabalho de três anos, consumiu R$ 400 milhões, incluindo o projeto e o lançamento. Nós somos muito jovens no Brasil e ainda não temos geração de caixa suficiente para bancar nossos investimentos. Portanto, é a matriz que libera os recursos.
Dinheiro – É fácil convencer o acionista francês a colocar dinheiro nos projetos brasileiros?
Gomes – Eu faço parte do board da PSA e me reporto diretamente ao chairman Philippe Varin. Eu sei que a América Latina é hoje uma das áreas prioritárias para o desenvolvimento do setor, e o Brasil, em particular, obviamente lidera esse processo. Portanto, eles, mais do que eu, querem que isso funcione. Então é muito fácil essa discussão sobre investimentos. A partir do momento em que você observa o mercado, suas perspectivas, potenciais concorrentes e tudo aquilo que é necessário para se ter êxito, os investimentos no Brasil são uma consequência natural.
Dinheiro – O crescimento contínuo do mercado automotivo brasileiro, mesmo em períodos de crise, deve facilitar a negociação com a matriz...
Gomes – Obviamente. A Europa tem um mercado que, além de não crescer, encolheu 25% nos últimos cinco anos. Isso é terrível para um grupo como o PSA, que é o segundo maior fabricantes na região, com 14% de participação de mercado. Portanto, ter essas bolhas de expansão, no bom sentido, no Brasil, na Rússia e na China são fundamentais para a indústria de automóveis.
Dinheiro – Quando se debate o Brasil na matriz, quais são os pontos considerados negativos?
Gomes – Existe a percepção de que poderia se fazer muito mais aqui. Isso tem a ver com as coisas que estão em constante debate, e que os brasileiros e os governantes conhecem perfeitamente. Eu me refiro ao custo Brasil, principalmente a energia. É inconcebível que a energia tenha esse preço no Brasil. Ela interdita toda a operação industrial. Para a indústria, a energia é um dos insumos mais importantes.
Dinheiro – Mas a perspectiva de redução entre 10% e 20% do custo da energia, já sinalizada pelo governo, não é bem-vinda?
Gomes – Sim, mas é suficiente? Eu acho que não. Compare com o custo da energia no Canadá. Aqui é 50% maior. Você acha que a energia pode ser 50% mais cara no Brasil do que no Canadá?
Dinheiro – E o que mais é negativo, além do custo da energia?
Gomes – O preço das matérias-primas. O aço, por exemplo, que nós compramos aqui, é entre 30% e 40% mais caro que o fabricado na China. É inconcebível, dada a quantidade de minério de ferro que o Brasil possui. A logística é outro ponto negativo, talvez o mais complicado, pois a energia e a matéria-prima são mais fáceis de serem atacadas com uma reforma tributária ou alguma ação do governo. Já a logística leva décadas.
Dinheiro – Quais são os gargalos mais relevantes?
Gomes – A inexistência de ferrovias e de transporte marítimo. Além disso, a qualidade das estradas não é homogênea. Há ótimas rodovias e outras muito ruins. Temos enormes desafios pela frente para resolver. Um deles é a reforma tributária, que ninguém consegue começar. O fato é que nenhuma empresa estrangeira consegue operar aqui sem ter contadores brasileiros, por causa da extrema complexidade dos impostos. A gente precisa de um batalhão de contadores. É um custo que não existe em nenhum lugar do mundo. É o custo para se ter a certeza de que nada de errado está sendo feito e de que o Estado não virá com multas no futuro.
Dinheiro – A PSA sente a elevação do custo e a falta de qualificação da mão de obra no Brasil?
Gomes – Vou dar um exemplo muito simples, que envolve as nossas concessionárias. O nível de rotatividade dos vendedores é de 40% a 50%. Significa que, após dois anos, não existe nenhum vendedor do grupo inicial, o que gera um custo de treinamento. Sem falar que o vendedor não conhece o produto adequadamente. Isso é verdade também no pós-vendas, na área técnica e na engenharia. O Brasil forma 40 mil engenheiros por ano, enquanto o México forma 110 mil. É, de fato, um problema do País, e a educação é claramente um dos eixos fundamentais para solucioná-lo.
Dinheiro – Quais são as metas da PSA para a América Latina e o Brasil?
Gomes – Nosso objetivo é ampliar nossa participação de 5,4% para 7% do mercado na América Latina, até 2015. No Brasil, os percentuais são os mesmos. Estamos investindo na nossa fábrica no Rio de Janeiro, renovando e inovando os nossos produtos, e apresentando carros como o novo C3.
Dinheiro – O balanço dos sete primeiros meses mostra que o mercado automotivo no Brasil cresceu 4,2%, enquanto a PSA encolheu 20,1%. O que ocorreu?
Gomes – Em janeiro e fevereiro, ficamos sem produzir em Porto Real, no Rio de Janeiro, porque estávamos investindo na ampliação da capacidade de produção da nossa fábrica. Como a operação foi mais longa do que nós prevíamos, isso afetou os estoques disponíveis para vendas no início do ano. Foi uma situação muito tensa. Outro fator que atrapalhou foi a expectativa que havia em torno do novo C3, o que derrubou as vendas do modelo antigo. A elevação do IPI para veículos importados também atrapalhou as vendas dos carros que trazemos da Europa.
Dinheiro – As vendas no mercado corporativo foram uma válvula de escape?
Gomes – Começamos nesse mercado há um ano e está sendo estratégico vender para todos os tipos de clientes. Se caíram as vendas para os consumidores, no B2B crescemos 25%, nos últimos 12 meses.
Dinheiro – A Citroën ainda tem uma imagem associada a um elevado custo de manutenção. Garantir um preço fixo para o cliente nas concessionárias é uma estratégia para mudar esse quadro?
Gomes – Nós estamos dizendo em alto e bom som que a ideia de que ter um Citroën custa caro e não tem peça é errada. Ao contrário, temos a cesta básica de peças mais competitiva do mercado.
Dinheiro – Quais são as perspectivas para 2013?
Gomes – As perspectivas são boas, por isso estamos investindo. Mas, ainda assim, reduzimos um pouco, de 3,8 milhões para 3,65 milhões de veículos, a previsão de vendas do mercado nacional no ano que vem.
Dinheiro – As novas regras do regime automotivo, que valerão a partir de 2013, devem prever um índice maior de nacionalização das peças. Isso assusta?
Gomes – Não, a gente já se enquadra. Estamos tranquilos quanto a isso, embora os detalhes do regime não tenham sido divulgados. O novo C3, por exemplo, tem 76% de conteúdo nacional.
Dinheiro – O grupo PSA está fazendo um trabalho específico para associar as marcas com a imagem de respeito ao meio ambiente?
Gomes – Somos um dos principais atores em ecologia na Europa, inovadores na tecnologia híbrida do diesel, e somos a empresa que mais vende veículos elétricos na Europa. No Brasil, a Citröen é o centro de competência mundial para os materiais verdes e bicombustíveis. O novo C3, por exemplo, tem 33 quilos de material verde, um número fantástico.
Dinheiro – Num país como o Brasil, em que o biodiesel e o etanol são fortes, há espaço para o carro elétrico?
Gomes – Eu penso que não.
Dinheiro – O governo cobrou das montadoras a manutenção de emprego, em troca da redução do IPI. Como está o grupo PSA nessa questão?
Gomes – Estamos cumprindo integralmente o acordo. Temos contratações previstas para o ano que vem, se o mercado estiver aquecido.
Dinheiro – Os empresários de outros setores industriais parecem mais pessimistas do que os da indústria automobilística. Eles estão errados?
Gomes – O Brasil, inegavelmente, tem condições de crescimento, embora exista um passado de instabilidade. Há muitos exemplos de empresários que ficaram na mão com as mudanças de política econômica. Quando se investe, você quer previsibilidade, mas isso nem sempre acontece, por fatores internos e externas. Muda a regra do IPI, a Argentina fecha a fronteira, o Brasil retalia, e nós estamos no meio disso tudo.
Dinheiro – Os chineses assustam?
Gomes – Não podemos jamais deixar de olhar para a China. Eles têm de ser respeitados, pois estão em via de ser a maior economia mundial, além de ter o maior mercado de automóveis. A China tem um mercado organizado, que quando quer alguma coisa, faz. O Estado, por exemplo, subsidia o aço para a indústria nacional ser competitiva no mundo.
Dinheiro – E eles têm qualidade?
Gomes – Eles ainda não têm, mas estão aprendendo, e a curva de aprendizado é exponencial. Quanto mais você faz, mais você aprende. Com 18 milhões de unidades, eles vão aprender. Imagino que nos próximos dez a 15 anos, surgirá um grupo chinês de primeiríssima linha.
Luís Artur Nogueira
Fonte: Isto É
Tweet
Notícias Relacionadas
- Importações de minério de ferro da China batem recorde em abril
- Maior mina de ferro do mundo fica no Brasil e tem o teor superior a 65%
- VAZ VILLA expõe suas Soluções em Matéria Prima para a Indústria Metalúrgica
- Metalurgia 2025: Executivo do Trust Group destaca tendências do mercado de aço e as oportunidades no comércio internacional
- Criada uma liga metálica leve e flexível para temperaturas extremas
- Congresso Técnico da Intermach aborda Tendências da Inteligência Artificial e Tecnologias de Automação Industrial para a Indústria
- Provável ‘avalanche’ de produtos chineses no mercado global devido à sobretaxa americana preocupa indústria brasileira
- Schulz de Joinville realiza distribuição milionária a colaboradores com base em resultados
- Veja Todas as Notícias