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Brasil pode ser o maior produtor de gusa verde do mundo.

Publicada em 2011-05-20



O Brasil tem grandes chances de se transformar em um grande produtor mundial de gusa verde, se houver uma mobilização nacional, incluindo empresários e governo, para superar os gargalos quem impedem a alavancagem do setor.

O alerta é do engenheiro Gustavo Correa, diretor-presidente da Vetorial Siderurgia, uma das maiores produtoras independentes de gusa do País, que neste ano pretende investir em modernização e novas fontes de energia com o objetivo de reduzir custos e obter ganhos de competitividade. Nesta entrevista exclusiva à revista Metalurgia, Materiais & Mineração, Gustavo afirma que o setor é muito pulverizado e que boa parte das empresas ainda se preocupa pouco com a inovação e, por isso, correm o risco de entrar em decadência. Mas ele acredita que é possível “virar o jogo” se os próprios empresários forem mais eficientes na lição de casa e puderem contar com uma política nacional para o setor que contemple, inclusive, maior acesso a linhas de financiamento de longo prazo.

Revista Metalurgia, Materiais & Mineração: Quais as perspectivas de mercado para a siderurgia em decorrência das obras para a Copa e Olimpíadas

Gustavo Correa: Diferentemente de declarações que vêm sendo feitas sobre o tema, não entendemos a Copa e as Olimpíadas como grandes “consumidores de aço”. A nosso juízo, existe, sim, um impacto indireto, porém muito relevante, que estes dois eventos poderão trazer, a partir do momento em que colocaram o Brasil ainda mais em evidência no mercado global. Neste sentido o efeito catalisador do calendário esportivo vindouro é muito importante. Vale ressaltar que o Brasil ainda detém um consumo aparente de aço per capta muito baixo, da ordem de 140 quilos por habitante por ano, enquanto que no México fica acima dos 300 quilos, China, cerca de 400 quilos, e na Coréia do Sul (recordista absoluto) o consumo se aproxima de mil quilos. Um país como o nosso, com os desafios que tem pela frente em infraestrutura e moradia, tem tudo para alcançar, no curto prazo, indicadores acima de 200 quilos. Esse patamar pode, inclusive, subir para 300 quilos, caso o Brasil permaneça na rota sustentável de crescimento e o governo federal atue com ma visão estadista de que tanto precisamos.
Em que medida aVetorial vem se beneficiando da consolidação no setor guseiro para seu crescimento dentro e fora do Brasil?

O setor ainda é muito pulverizado, contando com a participação de 70 empresas no País que, por sua vez, detém mais de 150 mini altos-fornos. Nos últimos anos fizemos, de fato, algumas aquisições visando ganhar escala e competitividade. Mas acreditamos que, no agregado, o incremento da produção independente do gusa no Brasil passa por modernização, produtividade e investimento. Neste último quesito, é fundamental que haja uma política nacional voltada para o reflorestamento e produção de carvão vegetal. O Brasil tem nas mãos uma oportunidade ímpar de negocio neste segmento, com vantagens comparativas, sociais e ambientais enormes, além de econômicas. Contudo, para que o setor deslanche é necessário que nós, empresários, façamos a nossa parte, sem dúvida. Mas é igualmente vital que o governo encampe o reflorestamento e o carvão vegetal como estratégicos não apenas ao setor, mas ao próprio País.


Revista Metalurgia, Materiais & Mineração: Essa mudança de postura em relação aos recursos florestais poderia realavancar o setor, por exemplo?

Gustavo Correa: Temos a convicção de que isso pode acontecer. Imagine o efeito multiplicador de uma siderurgia integrada a carvão vegetal com capacidade de 20 ou 30 milhões de toneladas/ano espalhada pelo País. Na prática, essa estrutura representaria a geração em cadeia de dezenas de milhares de empregos e a permanência de muitas famílias no campo, evitando, em conseqüência, a migração para as grandes cidades e seus famigerados efeitos nocivos. Há que se considerar também os benefícios ambientais de um modelo seqüestrador de carbono (a siderurgia clássica é responsável por cerca de 7% de toda a emissão de CO2 do mundo) e a economia de divisas, lembrando que todo o carvão vegetal mineral siderúrgico consumido no País é importado. Precisamos de alguém que encampe esse desafio e erga a bandeira do gusa verde, assim como fez, muito acertadamente, o ex-presidente Lula a favor do setor sucroalcoleiro.

Revista Metalurgia, Materiais & Mineração: Em termos de tendência, qual seria o novo desenho da estrutura de população independente de gusa no Brasil?

Gustavo Correa: Nós entendemos que existem dois cenários, um ruim e outro bom. No primeiro caso, haveria a decadência do setor, com diminuição da capacidade instalada e, conseqüentemente, queda da produção efetiva de gusa. Infelizmente, esse é o panorama em curso, segundo nossa visão. O cenário positivo representaria a virada do jogo, ou seja, novos investimentos, integração entre o setor de gusa e a verticalização com o aço, contando inclusive com os aciaristas. Contudo, para isso seria imprescindível o apoio institucional e governamental e, sobretudo, a ancoragem em política setorial consistente. Criadas essas condições, no prazo de 10 a 15 anos, poderemos ter um modelo exemplar e sustentável de siderurgia. Tecnicamente, o gusa verde elimina a necessidade de dessulfuração nas aciarias, o que significa um ganho ambiental importante. O gusa verde, produzido a partir de florestas plantadas, está para o gusa convencional a coque assim como o etanol está para a gasolina. É a conciliação ambiental com a econômica, além de benefícios sociais impressionantes!

Revista Metalurgia, Materiais & Mineração: Como o senhor avalia o desempenho atual do gusa no mercado doméstico em comparação com o exterior?

Gustavo Correa: Em termos setoriais, não estamos nada bem. Se refletirmos sobre os gargalos existentes, vamos chegar à conclusão de que não fizemos corretamente o nosso dever de casa e, por isso, estamos perdendo competitividade. É verdade que a variável cambial agravou esse quadro. Mas, se tivéssemos investido em modernização, escala, produtividade e em florestas, poderíamos ter alcançado patamares de competitividade bem mais confortáveis, mesmo com câmbio exageradamente apreciado. Hoje, competimos com Rússia e Ucrânia no gusa e com a sucata no mundo inteiro, com parques industriais defasados, custos de logística absurdos por conta de portos ineficientes e caríssimos, ferrovias ou ineficientes ou monopolistas, além do câmbio já citado. Mas, como disse antes, acreditamos sim que é possível ainda virar o jogo a nosso favor.

Revista Metalurgia, Materiais & Mineração: Em sua opinião, que outros entraves impedem que haja um salto quantitativo e qualitativo na produção brasileira de gusa?

Gustavo Correa: Algumas questões já foram levantadas, como a falta de uma política setorial bem definida e planejamento. Podemos ainda reforçar que há necessidade de focar as operações em três fatores críticos: escala, modernização e reinvestimento. Até há pouco tempo, tínhamos uma cultura de investir pouco, ter plantas pequenas e operar com pouca tecnologia; o custo ficava em segundo plano. Claro, erramos, mas houve falha também no País, que nunca deu crédito aos guseiros. Por causa disso, o setor fazia não tão bem feito por R$ 1 o que deveria ser muito bem feito com R$ 2. Hoje, estamos pagando a conta. A solução é olha pra trás, aprender com os erros e reinventar. Usinas maiores, modernas, com parques florestais adequados e logística eficiente, além de novas receitas dos co-produtos, como energia elétrica e escória. Com usinas de maior escala, a produtividade por homem/hora/ano deve crescer, o que nos livra da escassez de mão-de-obra que hoje é generalizada.

Revista Metalurgia, Materiais & Mineração: Como a Vetorial Siderurgia vem se preparando para conviver com as margens mais contraídas, devido a fatores conjunturais?

Gustavo Correa: Na economia globalizada, onde o fluxo de informações acontece em tempo real, tudo é praticamente transparente e o mercado, mais do que nunca, manda nos preços. Nesse cenário, a margem de barganha das empresas em relação aos concorrentes é pequena. Boa parte do diferencial tem que ser buscado dentro das próprias empresas, cortando custos para ganhar em competitividade. No caso da Vetorial, estamos muito atentos a essa realidade e nos preocupamos com custos 24h por dia e olhando pra frente. Paralelamente, seguimos a cartilha que venho defendendo focada em ganhos em escala, eficiência logística e modernização. Além disso, verticalizamos nosso negócio em minério de ferro próprio e em florestas próprias. Em 2017, alcançaremos a autosuficiência em recursos florestais, mas já a partir de 2012 nosso suprimento contará com participação significativa de carvão próprio.

Revista Metalurgia, Materiais & Mineração: Que investimentos a empresa prevê para este ano e quais serão as áreas prioritárias?

Gustavo Correa: Para sermos coerentes com a nossa estratégia de negócio, em termos de novos investimentos, as áreas prioritárias são aquelas cujo retorno venha através de redução de custos. Nesse sentido, devemos investir em duas PCI’s (injeção de finos) neste ano e continuar ampliando o parque florestal. Por outro lado, estamos estudando adquirir tecnologias que reduzam o consumo de carvão e gerem receitas com co-produtos como escória (como já fazemos em uma de nossas plantas) e excedentes de energia elétrica. Atualmente, duas de nossas usinas têm termoelétricas, mas estamos avaliando substituí-las por soluções capazes de elevar a geração de energia, resultando um excedente para venda. No final das contas, isso tudo pode se traduzir em redução de custos.

Fonte: Revista Metalurgia, Materiais & Mineração, adaptado por Painel Florestal


Fonte: Painel Florestal